
Sandra Carvalho
Devastação da Amazônia já atinge 95% de suas espécies
Queimadas e desmate ameaçam um dos maiores reservatórios de biodiversidade do planeta.

A Amazônia é o habitat de 1 de cada 10 espécies conhecidas no mundo. Sem ela, muitas plantas e animais desapareceriam, porque não existem em nenhum outro lugar do planeta.
Mas a floresta tem sido devastada pelo fogo numa escala inimaginável desde 2001. O impacto dessa destruição já é sentido por 95 % de suas espécies, e entre 77% e 85% das espécies consideradas ameaçadas da Lista Vermelha da #IUCN.
O alarme foi soado por um grupo internacional de cientistas, que fez mapas da biodiversidade da Amazônia com dados de 11.514 espécies de plantas e 3.079 animais vertebrados, e sobrepôs esses mapas com informações de satélites de incêndios florestais e desmate nas últimas duas décadas.
O estudo, publicado na Nature, indica que a Amazônia perdeu 20% de sua cobertura florestal desde os anos 60 devido ao fogo e ao desmate.
"Quanto mais desmatamento, mais fogo depois", comentou ao Valor o pesquisador Paulo Brando, do Instituto de Pesquisa Ambiental (#Ipam), e professor de Ecologia da Universidade da Califórnia em Irvine (#UCIrvine), um dos autores do estudo.
"O desmatamento é o principal vilão da biodiversidade da Amazônia com os incêndios florestais logo atrás", afirmou.
Os pesquisadores observaram que o Brasil vinha brecando o ritmo da destruição da Amazônia desde meados dos anos 2000, mas políticas de relaxamento da fiscalização mais recentes, a partir de 2016 e em particular a partir de 2019, anularam essa tendência.
"Em 2019 é como se tivessem tirado o pé do freio, fazendo que o desflorestamento acelerasse de novo", observou Brian Enquist, professor de Ecologia e Biologia Evolutiva da Universidade do Arizona (#UArizona), um dos autores do estudo.
A tendência de destruição pode ser revertida, na opinião dos cientistas.
"Como a maioria dos incêndios são ateados intencionalmente pelas pessoas, prevenir o fogo
é bastante possível", observou Patrick Roehrdanz, do Centro Moore para Ciência da organização Conservation International, um dos autores do estudo.
"Uma forma é retomar o compromisso com políticas antidesflorestamento fortes no Brasil, combinadas com incentivos para uma economia florestal, e replicá-los em outros países amazônicos", ele sugere.

O desflorestamento provoca um efeito cascata na Amazônia. “O aumento do desmatamento implica o aumento das áreas de queimada, e isso reduz a biodiversidade em escalas locais e regionais", notou Danilo Neves, professor da #UFMG, outro dos autores do estudo.
"Como algumas espécies têm distribuição muito restrita, esse processo pode até gerar a extinção de plantas e animais. Cada espécie tem um papel fundamental, e sua perda pode culminar no colapso desses ecossistemas", advertiu.
As queimadas podem matar animais e ter consequências terríveis para as plantas também.
"As plantas amazônicas não têm adaptações ao fogo como as plantas do Cerrado, e geralmente morrem após a passagem do fogo, transformando a floresta fechada em ambientes abertos", notou o pesquisador Mathias Pires, da Unicamp, também um dos autores do estudo, à Agência Bori. ✔︎